Vivemos no mínimo em dois mundos, o exterior, objetivo, concreto, no qual há limites, pois na dimensão pública, a liberdade de um termina quando começa a liberdade do outro, e um mundo interior, subjetivo, abstrato, ilimitado no qual guardamos a riqueza da dimensão do infinito, eterno e espiritual. As inconformidades, os conflitos internos, as insatisfações, frustrações e decepções são causadas pela incompetência em compreender que vivemos em mundos distintos, cada qual com diferentes valores, e quando desprezamos um deles, em favor do outro, estamos lutando contra a própria natureza humana.
A sensação de incompletude humana é originária do desconhecimento de que a dimensões da essência e da existência humanas são complementares. A existência diz respeito ao tempo em que a vida estará no corpo, mas a essência é energia da vida que perpassa todos os corpos. Os mundos, quer da existência externa, quer da essência interna, têm valores distintos que se complementam, e andar nos dois mundos requer do equilibrista escolher os movimentos certos de cada passo. O pé ao tocar na corda bamba, deve sentir para que lado deve pender o corpo a fim de que o peso seja compensado, caso contrário a queda será a consequência do corpo despreparado, solto sem o comando da mente.
Equilibrar-se entre os dois mundos é a arte de aprender a entregar-se ao imprevisível, em cada momento, ter a confiança que vai conseguir dominar o medo de cair e manter-se no fio estreito do cotidiano. Tal faceta, tamanho desafio, é o resultado do uso da mente com sabedoria de quem aprendeu a dominar os instintos para entrar no estado da arte, trazendo a beleza do encontro entre os mundos, entrando e saindo, trocando aprendizados, adquirindo experiências para livrar-se das quedas.
Trazer a dimensão interna para harmonizar a vida externa requer técnica, ter a chave de através do exercício, abrir a porta para encontrar o equilíbrio no desequilíbrio, assim como se aprende a andar de bicicleta. Quando a bicicleta tende para um lado, o corpo tende para o outro lado, e o equilíbrio acontece. Simples assim, mas precisa de exercício, quando os instintos quiserem dominar, trazer para a consciência, as consequências dos atos, e a vida entra em harmonia. Andar na corda bamba dos dois mundos requer o plantio de boas escolhas durante o dia, no mundo das exterioridades, para colher sonhos alvissareiros, durante a noite, no mundo das interioridades. A qualidade do sono noturno, dependerá da qualidade das escolhas diurnas. A colheita de um sono reparador depende do plantio de atos responsáveis. Conciliar as duas dimensões humanas é conectar-se com a essência que está em cada existência, é viver em cada momento, a dimensão de eternidade.
