Os maiores desastres naturais desde 1990, excluindo epidemias e fomes, mataram seiscentas mil pessoas, e muitas pessoas foram simpáticas ao acontecimento, lamentaram todo sofrimento do povo e, sentiram-se aliviados, porque o evento aconteceu no Haiti, China e Japão, em outros países, mas aqui, os terremotos, tsunami e inundações são raros, e a família está salva, e todos estão bem, e isto é o suficiente para que o sofrimento do povo seja esquecido.
Esta é a diferença entre simpatia e empatia porque enquanto a simpatia é o lamento passageiro, a empatia é sentir a dor do outro. E ainda mais, a empatia não permite a imobilidade, de tal forma que se envolve com o outro como se ele fosse.
O mais interessante é que a empatia é mais comum entre os humildes, porque dependem mais uns dos outros, e é exatamente esta rede de empatia que forma a comunidade. As pessoas que já possuem uma condição econômica estável, preferem não se ligar a ninguém, livres dos outros, sem perturbações, defendem a individualidade, e se preservam, encastelados no conforto da moradia.
Porém na comunidade, não há o movimento de ser livres do outro, pelo contrário, os empáticos precisam e querem estar ali, agregados porque a necessidade do outro é mútua e, se fortalecem porque a dor de um, é a dor de todos. O conceito de empatia também serve para definir uma comunidade. Os de menor condição social, têm sede de comunidade, e buscam uma vida gregária, ao ponto de suplantar as diferenças individuais, para estarem juntos apoiando-se mutuamente. O aspecto gregário é tão grande que supera as incoerências da convivência, porque o estar juntos torna-os mais fortes.
A comunidade torna-se patológica quando forma grupos de pessoas que pensam igual, que são clones de uma percepção única comum, e quem pensa diferente, é inimigo e o jeito é ter uma arma na mão para impor ideias. Formam máfias, na ilusão que são comunidades, mas no espaço verdadeiramente comunitário é possível ter visões de mundo diferentes e, ao invés de individualismo, buscam a individuação e cada um, tem o direito de pensar por si mesmo e, mesmo assim conviver com outras visões de mundo, nem melhores e nem piores, apenas diferentes. Cada um tem o direito de ter sua visão de mundo, que se amplia e se junta a outras visões, e esta é a riqueza da diversidade.
O papel da educação é fundamental para que as gerações futuras tenham o senso de comunidade, ensinando as crianças a nobreza de servir, como o sentido da própria existência, e assim tornam-se livres do vício de estarem criando necessidades para serem atendidas. Os empáticos sentem-se bem na relação “Eu e Tu”, considerada matriz enérgica de uma vida limpa, que se baseia na satisfação de servir de graça ao invés do prazer de ser servido.
Na cena final do filme do Rei Artur, nos últimos momentos de vida, o rei pergunta ao Merlin porque nunca revelou que, durante as guerras, usava o seu poder de mago para protege-lo, salvando sua vida, pelo que Merlin respondeu: Eu nasci para lhe servir. O fato de poder servir ao Rei com alegria, deu sentido a vida de Merlin.
Na verdade, nós não temos um projeto próprio, nós estamos aqui a serviço de algum plano do qual fazemos parte. Não entender isso, é a total inconsciência do que realmente si é. O que traz sentido na vida é o serviço, e o próprio nome é a união do verbo “ser” mais o substantivo “viço” que significa o brilho da exuberância juvenil.
Conectar-se com o ser + viço ou seja, prestar um serviço, foi o que manteve vivo o médico austríaco, Victor Frankl, durante quatro anos de prisão, nos campos de concentração nazista, enquanto os prisioneiros judeus que optaram pela apatia de se sentirem vítimas, morreram até antes de morrer. Frankl permaneceu vivo porque encontrou sentido no sofrimento, e aprendeu a superar limites e, quando a guerra terminou, criou o conceito da logoterapia, um processo de cura da alma, com filiais no mundo inteiro. Frankl descobriu que a vida tem sentido para aquele que serve e não para o que é servido, que o vício do antropocentrismo, não atende ao plano a criação.
É no vínculo comunitário que temos a experiência da gentileza com gratuidade sem interesse, com profunda gratidão, doador e recebedor são beneficiados porque nascemos naturalmente generosos. É fundamental preservar os valores de afetos mútuos, de evocar a consciência acima da racionalidade para evitar uma finalização catastrófica, pois tecnologia não necessariamente é desenvolvimento ou progresso, e futuro não é um lugar que está a nossa espera, e sim algo a ser construído.
É a educação com base na pedagogia da esperança que vai nos ajudar a fazer este percurso para criar a sociedade do cuidado, porque como diz a música “quando a gente ama, é claro que a gente cuida”, e o cuidado em conjunto é a base da vida em comunidade, é a comunhão dos diferentes que se dão as mãos, não para serem “bonzinhos” ou piegas, mas para que cada um, com sua autonomia, supere desafios que podem parecer contraproducentes, no primeiro momento, mas não impedem de evoluir quando o propósito de servir é firme, a vida abre caminhos, para que este projeto incrível da humanidade permaneça porque somos os únicos, de todas as espécies, de todos os outros reinos, que recebeu do Criador, o privilégio da consciência.
Magui Guimarães